Transtorno de ansiedade e o povo brasileiro

Já se evidencia o impacto dos transtornos ansiosos na qualidade de vida das sociedades modernas. Dados da Organização Mundiaç da Saúde – OMS sugerem que o Brasil é o país mais ansioso do mundo. O transtorno ansioso, entre os transtornos mentais, é o que mais depende do ambiente para se desenvolver. Assim, esse cenário pode estar associado à nossa instabilidade socioeconômica, à pressão no ambiente de trabalho, aos desafios na convivência social, à falta de segurança pública, dentre outros fatores.

Diante desse contexto, o transtorno de ansiedade parece fazer parte do cotidiano do povo brasileiro, manifestando-se como um padrão persistente de preocupação constante com o futuro, com o medo iminente diante das incertezas políticas e econômicas e com a apreensão sobre como cuidar da saúde, educação e segurança. Esse quadro pode nos deixar em um estado atual de alerta, comprometendo a saúde mental.

Não é normal ficar apreensivo todos os dias, não relaxar, se preocupar com tudo a todo instante e perder o sono diante dessas demandas. Pode parecer algo comum, mas o fato é que isso pode indicar um transtorno psiquiátrico, que muitas vezes é porta de entrada para outros problemas, como depressão e crises de pânico.

 

Será que tenho ansiedade?

  • Preocupação excessiva: Experimentar uma preocupação exacerbada em diversas áreas da vida, como trabalho, saúde, finanças e relacionamentos, mesmo diante de evidências que indicam baixa probabilidade de ocorrência de eventos negativos.
  • Inquietação e melhoria: Sentir nervosismo constante e incapacidade de relaxar, frequentemente acompanhado de tensão muscular e dificuldade para manter o foco nas atividades do cotidiano.
  • Sintomas físicos: Manifestar palpitações, sudorese, tremores e desconforto gastrointestinal, sintomas que podem ser confundidos com outras condições médicas.
  • Mente estratégica: Desenvolver diversas estratégias para minimizar o impacto de problemas ou para enfrentar determinadas situações.
  • Dificuldade de concentração e problemas de sono: A hiperatividade mental prejudica a concentração nas atividades cotidianas e interfere na qualidade do sono.

 

Por exemplo, uma pessoa que se preocupa de forma desproporcional com a possibilidade de perder o emprego pode se comportar de maneira mais defensiva no trabalho, afetando suas relações e aumentando as chances de desenvolver sintomas ansiosos – que vão desde a inquietação até crises de pânico. Tais comportamentos, quando persistentes e específicos, podem ser categorizados como transtornos de ansiedade, exigindo uma abordagem clínica especializada.

A identificação precoce desses sinais de alerta é crucial para uma intervenção terapêutica. A partir do reconhecimento dos sintomas, os profissionais de saúde mental podem realizar avaliações mais aprofundadas e iniciar estratégias de tratamento que visem à redução dos níveis de ansiedade e à melhoria da qualidade de vida.

Terapia Cognitivo-Comportamental: no tratamento da ansiedade 

Entre as abordagens terapêuticas disponíveis, a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) destaca-se como a primeira escolha no tratamento não medicamentoso da ansiedade. Essa modalidade terapêutica baseia-se em evidências científicas robustas, com inúmeras metanálises comprovando sua eficácia na redução dos sintomas e na promoção de estratégias de enfrentamento mais adaptativas.

Um tratamento prático

A TCC é uma modalidade em que o terapeuta desempenha um papel importante na organização do problema e na educação sobre os sintomas, o tratamento e até mesmo o funcionamento cerebral. Contudo, o paciente tem um papel principal como relator do seu contexto e como treinador das habilidades propostas durante o tratamento.

Entende-se que os pensamentos influenciam a maneira como nos sentimos e agimos. No caso de preocupação, é necessário compreender quais pensamentos compõem a preocupação que mantém o transtorno, bem como as ações empregadas para neutralizar essas inquietações.

Cito algumas técnicas utilizadas:

  1. Reestruturação Cognitiva:
    Este processo envolve a identificação e a modificação de pensamentos distorcidos ou disfuncionais que são elevados para a manutenção dos sintomas ansiosos. O paciente é estimulado a desafiar e reavaliar ideias irracionais, gerando uma visão mais realista e equilibrada dos acontecimentos. Por exemplo, a crença de que um erro no trabalho pode significar o fim da carreira é trabalhado para que o paciente compreenda que equívocos fazem parte do processo de aprendizagem e que todos, inclusive seus colegas, estão sujeitos a cometer erros.
  2. Intervenções Comportamentais:
    A TCC também utiliza técnicas de exposição gradual, treinamento de relaxamento e outras estratégias que visam modificar comportamentos evitados. Ao enfrentar progressivamente situações que provocam ansiedade, o paciente aprende a lidar com a incerteza e a reduzir a hipervigilância associada ao transtorno. Essas intervenções contribuíram para a criação de um ciclo de autoeficácia, em que a superação dos medos reforça a confiança na capacidade de enfrentar desafios.

Além do alívio dos sintomas, o tratamento não apenas reduz os sintomas de ansiedade, mas também promove mudanças na forma como os indivíduos interpretam e reagem a estímulos estressantes. A neurociência contribui para esse entendimento, evidenciando que a TCC pode alterar padrões de atividade cerebral relacionados à regulação emocional. Essas mudanças são observadas, por exemplo, na diminuição da hiperatividade do sistema límbico – responsável por respostas emocionais intensas – e no fortalecimento das funções executivas do córtex pré-frontal, que auxiliam na tomada de decisões e no controle dos impulsos.

Além disso, uma abordagem cognitivo-comportamental integra a educação do paciente sobre o funcionamento das emoções, permitindo uma compreensão mais aprofundada dos processos que influenciam sua saúde mental. Essa transparência terapêutica, aliada às técnicas práticas e estruturadas, torna o TCC uma ferramenta poderosa tanto no tratamento quanto na prevenção de recaídas.

A terapia cognitivo-comportamental é um processo terapêutico considerado breve; portanto, busque ajuda. Com o advento das tecnologias da informação (TICs), você pode optar por um terapeuta com quem se identifica, mesmo que ele esteja em outro estado ou país. Atendemos diversos brasileiros que moram no exterior. Não hesite em procurar ajuda.

caso queira saber mais sobre o sentimento de ansiedade sugiro a leitura desse texto. 

Referências

  1. Associação Psiquiátrica Americana. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais: DSM-5 . 5ª ed. Washington, DC: Associação Psiquiátrica Americana; 2013.
  2. Clark DA, Beck AT. Terapia cognitiva de transtornos de ansiedade: ciência e prática . Nova York: Guilford Press; 2010.
  3. Hofmann SG, Asnaani A, Vonk IJ, Sawyer AT, Fang A. A eficácia da terapia cognitivo-comportamental: uma revisão de meta-análises. Cogn Ther Res . 2012;36(5):427-440.
  4. Organização Mundial da Saúde. Atlas de Saúde Mental 2017 . Genebra: Organização Mundial da Saúde; 2017.

 

Abraços.

 

Foto de Tatiane Sanches

Tatiane Sanches

Sou psicóloga, neuropsicóloga e terapeuta cognitivo-comportamental, com especialização em neurodesenvolvimento e seus transtornos além de sexualidade. Minha paixão pela psicologia nasceu de uma trajetória de vida marcada pela resiliência, desde que fiquei órfã aos 16 anos. Essa experiência me motivou a escolher a psicologia como profissão. Minha vida é a prova de que desejos e emoções vêm e vão. Somente aos 38 anos, senti o desejo de viver a maternidade e, aos 40, chegou o Martin, um garotinho curioso e feliz que tem sido meu maior professor na prática dos processos de desenvolvimento humano. Nesse espaço compartilharei um pouco do conhecimento sobre saúde mental, neurodesenvolvimento e os desafios da vida com leveza, embasamento científico e uma linguagem acessível. Espero que os conteúdos daqui inspirem reflexões, respondam dúvidas e auxiliem você a compreender mais sobre si mesmo(a) e sobre aqueles ao seu redor. Sinta-se à vontade para explorar, aprender e interagir. Vamos juntos construir um olhar mais cuidadoso para o desenvolvimento e a saúde mental!

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